O Potencial Cultural Adormecido da Baixada Fluminense

DUQUE DE CAXIAS

Dando continuidade a série de reportagens especiais pela história e a cultura de Duque de Caxias e da Baixada Fluminense, vamos percorrendo esta trilha de conhecimento com a experiência do professor Antônio Augusto Braz, mestre em História Social do Brasil, coordenador do Museu Vivo de São Bento, membro fundador da APPH-CLIO, da Asamih.

É com grande paixão, militantância e entusiasmo que o professor Antônio Augusto tem se dedicado a Museologia Social. Além do Museu Vivo de São Bento, ele também é ditetor técnico do Museu Vivo da Capoeira em Nova Campina, Duque de Caxias e do Museu Vivo de Areia Branca em Belford Roxo. A Museologia Social tem como cerne a defesa de que o museu seja apropriado como uma ferramenta de uso comunitário e participativo, para que as pessoas pesquisem, compreendam a importância de salvaguardar o patrimônio histórico e cultural , gerando emprego e renda e estimulando a auto-estima dos moradores de sua região.

A Rede Estadual de Museologia Social – Remus, por meio do Diretor do Museu da República, Mário Chagas, reúne desde 2010 representantes de diversos museus comunitários/sociais que trabalham em sistema de trocas de experiência, além de criarem ações e projetos comuns.
No último dia 27 de junho, a Remus reuniu diversos representantes dos museus sociais, no Museu das Remoções, na Vila Autógramo em Jacarepaguá, no município do Rio de Janeiro.

Alguns Museus que fazem parte da REMUS
– Museu da Maré;
– Museu de Favela;
– Museu das Remoções;
– Museu Sankofa da Rocinha;
– Museu Vivo de São Bento;
– Cerro Corá Moradores em Movimento;
– Ecomuseu Santa Cruz;
– Museu Casa Bumba Meu Boi/Raizes do Gericinó;
– Museu Vivo de Areias Brancas;
– Museu Marinheiro João Cândido;
– Museu Memorial Iyá Davina;
– Núcleo de Orientação e Pesquisa Histórica de Santa Cruz;
– Museu do Graffiti;
– Museu da República;

* A Superintendência de Museus do Estado do Rio de Janeiro é nossa parceira com cadeira permanente na articulação da REMUS.

Museu Vivo de Areia Branca

Presidente do Museu Vivo de Areia Branca, Renato Muniz e a artista plástica Ester Santos

O Museu Vivo de Areia Branca foi inaugurado no dia 27 de fevereiro de 2022 sendo o primeiro museu social no município de Belford Roxo. Surge com a proposta de ser um espaço cultural e ao mesmo tempo um instrumento de luta da comunidade onde está inserido.

Os objetivos principais do Museu Vivo de Areia Branca são:
Pesquisar, arquivar e apresentar em forma de exposições a História, a Cultura e o Patrimônio do bairro de Areia Branca, em Belford Roxo, em sintonia sempre com a História, Cultural e Patrimôniodo Brasil e do mundo. Dialogar com a rede de ensino municipal e estadual da cidade, para oferecer aos alunos e profissionais de Educação contribuiçcão para o aprofundamento do conhecimento e o fortalecimento da cidadania.

Inauguração do Museu Vivo de Areia Branca

Quem conhece a História de seu lugar tem maiores condições de atuarpara melhorar a realidade social de seu entorno. O Museu Vivo de Areia Branca objetiva potencializar a renda da comunidade dialogando com as diversas ações culturais do bairro e da cidade e potencializando o turismo interno. O Museu e Cultura são também emprego e renda. O Museu ao cuidarda Memória das famílias trabalhadoras do bairro e da cidade, valoriza a luta de nossa gente aumentando a autoestima.

Evento
Museu Vivo de Areia Branca em seu 1o evento, homenageou às mulheres artistas de Belford Roxo. Com música ao vivo, dança, poesia, desfile e exposição de artesanato e artes plásticas. Organizado por Telma Moreno que é diretora social, produtora de moda e eventos do Museu. O evento contou com a presença de artistas locais, convidados, diretoria, imprensa, amigos e familiares das homenageadas.

Foram 23 artistas empreendedoras homenageadas, ativistas, artesãs, artistas plásticos e cantoras, capelã, compositoras, dançarina, digital influencer, escritoras,fotógrafa, mestra e oficineira em dança Afro, modelos produtoras executiva de shows biseness, poetisa, produtora miss Baixada, produtora de moda e pedagogas.

O evento contou com a participação do grupo MP Mulheres que atuam no combate à violência doméstica e desigualdade social com exposição de artesanato. E com a fundadora do Instituto de mulheres negras herdeiras Candaces , que tem o compromisso de combater o racismo, discriminaçãoe violências enfrentadas por mulheres especialmente negras, em situação de vulnerabilidade social.

Em breve estará acontecendo no museu, cursos de capacitação: pintura em tela, artesanato, pintura de faixas, passarela, customização de roupas, crochê, teatro , pintura em seda, canto customização. Informações pelo whatsApp : 96893-5408.
Nosso segundo evento foi o ensaio aberto com Reinaldo Amâncio e Telma Moreno que além de produtora e também atua como cantora. Nos acompanhe no instagram @museu_vivo de Areia Branca.

Museu das Remoções

Na década de 1960, nas margens da Lagoa de Jacarepaguá, formou-se uma colônia de pescadores, que na década seguinte com a construção do Autódromo ao lado da colônia, cresceria ao acolher os trabalhadores desta obra e ficaria conhecida como “Vila Autódromo”. Com a expansão e desenvolvimento urbano da Barra da Tijuca, inicia a especulação imobiliária na região e as ameaças de remoção na década de 1990. A preparação dos Jogos Olímpicos gera um investimento financeiro bilionário que efetiva as remoções na Vila Autódromo. Moradores e apoiadores organizam uma resistência pautada em ações culturais e educativas compondo um movimento denominado “Ocupa Vila Autódromo” e deste, nasce o “Museu das Remoções”. Nascido para lutar, que entre outras ações, descobriu na fotografia uma forma de resistência.

Exposição Digital “Nossa Casa, Nossa História”
As remoções que desconfiguraram as dinâmicas territoriais da Vila Autódromo para dar lugar ao estacionamento do Parque Olímpico, em 2016, podem ser relacionadas aos despejos que ocorreram no Brasil durante a pandemia de Covid-19 que desabrigaram diversas famílias no momento em que uma das recomendações básicas era “ficar em casa”. Nos dois casos, as transformações urbanas que engendram a estratificação social operaram em detrimento da garantia de direitos fundamentais.

As transformações espaciais urbanas, não somente desencadeiam transformações materiais, mas também produzem reorganizações profundas nos âmbitos social, político e cultural das cidades. Acrescenta-se ainda, que os projetos urbanísticos muitas vezes atendem aos interesses dominantes em detrimento das necessidades básicas dos setores populares, tendo fenômenos como a gentrificação e a remoção de famílias como produtos diretos de sua execução, o que acentua a segregação socioespacial e a precariedade urbana no que cerne à infraestrutura básica e à proteção dos patrimônios comunitários.

Nesse contexto, compreende-se a memória como uma formulação que expressa as relações sociais, sendo a memória nacional difundida e reafirmada como a forma mais acabada de memória coletiva. Sabendo, então, que a nação é uma formulação hegemônica, é preciso acessar as memórias de minorias políticas. A partir dessa compreensão, este trabalho apresenta as possibilidades de utilização da memória social como dispositivo de reivindicação do direito à cidade e luta pela garantia do direito à moradia digna, por grupos populares e periféricos, que vivem às margens das cidades.

Por conta desse cenário, a exposição digital “Nossa Casa, Nossa História: Memórias de Remoções, Despejos e Pandemia”, se desenvolve de forma colaborativa, envolvendo a Vila Autódromo, por seu trabalho de preservação de memórias das remoções e outras comunidades parceiras que passaram ou estão passando por processo de remoção mesmo durante a pandemia. Confira!

Exposição digital “Nossa Casa, Nossa História: Memórias de Remoções, Despejos e Pandemia”, é um projeto do Museu das Remoções em parceria com o Grupo de Pesquisa MEI – Museologia Experimental e Imagem, apoiada pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).
Como forma de resistência, com moradores e apoiadores externos ocuparam a comunidade com uma série de eventos culturais, os #OcupaVilaAutódromo.

Museu Memorial Iyá Davina

Mãe Meninazinha de Oxum criou o primeiro museu etnográfico do estado do Rio de Janeiro, dedicado às Comunidades Tradicionais de Terreiros

O Museu Memorial Iyá Davina foi criado por Mãe Meninazinha de Oxum, em 1997, em homenagem à matriarca Iyá Davina. O museu reúne um acervo de objetos sagrados e de uso rotineiro, fotografias e documentos guardados pela matriarca e configura-se também como uma importante coleção etnográfica para pesquisa e preservação da memória dos povos de matriz africana. Reconhecido como o primeiro museu memorial do gênero no estado do Rio de Janeiro, o Museu Memorial Iyá Davina possui um acervo com mais de 150 itens inventariados e recebe, desde então, a atenção das comunidades tradicionais afrobrasileiras das mais variadas partes do país, além de estudantes, pesquisadores e turistas. A instituição museológica é registrada pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e se apresenta como uma das únicas opções de museus no município de São João de Meriti.

Mãe Meninazinha de Oxum revela que este legado faz parte da história e precisa ser tratado com todo o respeito que merece. ‘’Ao longo dos anos, procurei seguir os passos de minha avó materna e também minha mãe de santo, para preservar o nosso patrimônio. Eu queria um espaço para contar a nossa história: um museu de memórias e de preservação deste acervo. Um objeto em especial me despertou para esta idéia, o banquinho de madeira da minha avó’’, relembra Mãe Meninazinha. A partir daquele objeto, comecei a reunir os outros e percebi que tínhamos uma coleção importante. Ela conta, também, que criar um museu como este não foi tarefa fácil. ‘’Na época, parecia maluquice ter um museu num terreiro, mas conseguimos o fato inédito de criar, ainda nos anos 90, um museu dedicado a abrigar uma parte da memória do candomblé a partir da trajetória da nossa família de axé’’, conclui a Iyalorixá, que é a principal liderança do movimento que após longa mobilização da comunidade afrobrasileira, conseguiu a transferência da primeira coleção etnográfica tombada pelo Iphan, em 1937, de objetos sagrados das religiões de matriz africana, da Polícia Civil para o Museu da República.

A curadoria é assinada por Marco Antonio Teobaldo, que atenta para a relevância dos artigos já que, além de revelarem suas trajetórias, permitem manter viva a biografia daqueles que os utilizaram. ‘’A partir deste acervo inicial guardado ao longo dos anos por Iyá Davina e, posteriormente, com outros itens agregados por Mãe Meninazinha de Oxum, conseguimos construir uma narrativa sobre uma parte do candomblé da Bahia que se deslocou para o Rio de Janeiro no começo do século passado, a organização dos primeiros terreiros e rodas de samba na Região Portuária, o deslocamento dos povos de terreiro para a Baixada Fluminense e a formação destes núcleos de resistência. É importante destacar a ação visionária de Mãe Meninazinha de Oxum quando fundou o Museu Memorial em homenagem à sua avó biológica, tornando-se referência para outros terreiros, que despertaram para a importância da história que podem contar estes objetos.

Atualmente, existe uma infinidade de iniciativas similares, em todo o Brasil, que evitam o apagamento da memória do povo de terreiro e contribuem para que estas histórias não sejam contadas de forma distorcida por outras pessoas’’, enfatiza Teobaldo que é, também, curador do Instituto de Pesquisa Pretos Novos.

Para ilustrar melhor esta história incrível, o Ilê Omolu Oxum lançou em suas redes sociais o documentário “Balaio de Omolu”, no qual Mãe Meninazinha de Oxum remonta os primórdios da fundação do seu terreiro, na Marambaia, município de Nova Iguaçu, até a sua transferência para São Mateus, em São João de Meriti, revivendo suas lembranças com o grupo de remanescentes daquela época e revisitando o acervo de objetos sagrados do Museu Memorial Iyá Davina. Com a duração de 28 minutos, o documentário é dirigido por Fernando Sousa e Gabriel Barbosa, da Quiprocó Filmes, com a realização conjunta do Ilê Omolu Oxum e Quimera Empreendimentos Culturais.

Sobre Iyá Davina

(Salvador, 15 de agosto de 1880 – Rio de Janeiro, 3 de junho de 1964)
Ela se mudou em 1920, de Salvador para o Rio de Janeiro, com o seu marido, Theóphilo Marcelino Pereira, fixando-se inicialmente no bairro da Saúde, Região Portuária. Sua residência serviu de referência e hospedagem provisória aos conterrâneos que migravam para a cidade, de tal forma que o lugar ficou conhecido como “Consulado Baiano”. Ela se ligou ao terreiro do Babalorixá João Alabá, localizado à Rua Barão de São Félix, já famoso naquele tempo e frequentado por figuras importantes da cultura carioca.

Após a morte do pai de santo em 1926, a casa religiosa mudou-se com a sua sucessora, Tia Pequena de Oxalá e seu esposo Vicente Bankolê, com ajuda de Iyá Davina, para o bairro de Bento Ribeiro, onde permaneceram até 1932. Posteriormente, foram para Mesquita, onde instalaram a primeira roça de candomblé da Baixada Fluminense. Com o nome oficial de Sociedade Beneficente da Santa Cruz de Nosso Senhor do Bonfim, a Casa-Grande de Mesquita, após a morte de Tia Pequena, passou a ser comandada por Iyá Davina, até seu falecimento, em 1964, sendo a última iyalorixá daquele axé.

Serviço:
Museu Memorial Iyá Davina
Direção Mãe Meninazinha de Oxum
Curadoria Marco Antonio Teobaldo

Por conta da pandemia, a visitação é feita com grupos limitados a 20 pessoas, sob agendamento por meio das redes sociais Facebook e Instagram do Ilê Omolu Oxum.